Não há grandes novidades na vida dela.
As certezas esfumaram-se.
Agora espera pacientemente que os sinos da igreja clamem aleluias e que os autocarros não se atrasem muito. Não tem pressas mas, tem desejos de sair daquele lugar. Pela necessidade de rapidez. A vida dela esteve parada muito tempo sem que tivesse oportunidade de perceber.
Tomaram um copo num bar perdido da cidade. Fumaram muitos cigarros. E ela só tinha um nó no pescoço, perto do coração e do vómito que conduzia às lágrimas que corajosamente não verteu. Num sopro de razão não tinha razões para chorar. A despedida era dela. Pelo mal que lhe faz.
Mas seria essa a dificuldade que sentia na digestão? A incapacidade de regressar do estado de alienabilidade racional a que se deixara comprometer. Que a punha num estado de incompreensão do seu sistema neuro-simpático, e que não lhe permitia apreciar a bebida entornada no copo. Acompanhada de cigarros. Muitos, que lhe secavam a garganta e que lhe provocavam a tosse.
Não percebia. A dependência da prisão emocional a que se submetera.
Mas pronto! Foi desta! Terá mesmo sido? Já não promete. Nada. Espera só que o autocarro não se atrase muito e a leve dali. Com o vento e a chuva à mistura. Espera poder enterrar-se num banho quente sem espuma e num copo doce de mel e chá.
E que os dias que se seguem sejam muitos e rápidos. Para rapidamente esquecer-se de que foi outra pessoa que não sabia esconder dentro de si. E de quem nunca gostou. Desde a primeira vez.
Procurou respostas para o desconforto tímido e sufocante que sentia desde o início em sítios de respostas dúbias. Procurou o conforto em teorias de Leis Universais e em segredos naturais, escondidos em rochas e nas estrelas e no sussurro de vozes antigas. Só conseguiu suspiros. Escondia-se assim da pessoa que era. E de quem não gostava de ser. E não resultou.
A vida passava-lhe entre os cabelos sem corte e o olhar sem sorriso. E estava cansada.
Apesar dos copos que beberam, e de esperar o autocarro que a leve para longe até ao banho quente com mel e chá, sabe bem que o sorriso não lhe voltará tão facilmente. Aquela pessoa que de si se apossou vai ficar por uns tempos. Porque não a compreende. Não a consegue explicar. E por isso não promete. Porque já o fez muitas vezes.
Vai esperar. Resta-lhe esperar. Que venha o autocarro. Que os dias passem rápidos para não dar por eles. E talvez um dia volte a poder sentar-se a beber copos com cigarros e o sol brilhe mesmo lá fora.
28.10.05
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4 comentários:
vou fingir que tenho de apanhar o mesmo autocarro que ela, pois é tão deliciosa a sua escrita...
Dizem que este inverno vai ser ameno. Pode ser que passe depressa e nem o sintamos.
Estava a navegar pelo orkut >> estava a navegar pelo reiki >> estava a navegar pela Mariana e aportei aqui numa manha de domingo: gostei!!...
Obrigada. Aos três.
Pode ser Alexandra, pode ser...
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